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quinta-feira, junho 15, 2006

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Mas se fosse outro momento, se estivesse mais noite, se a praça pudesse liquefazer o cheiro das folhas mais verdes em vapor, se as pessoas e as conversas estivessem mais entorpecidas, se fosse primavera, se fosse possível, ela se aproximaria. Rumando por entre as árvores, colhendo um ou outro graveto no chão, um pouco atrasada nas conclusões, retida no limite da vontade, um tanto nervosa nos dentes e lábios, mordendo frutos imaginários Se fosse certo, se fosse melhor, ela se aproximaria. Lembrou de coincidências vãs, comparou letras iniciais de nomes, se estivesse mais noite, se a praça camuflasse o amor com mais lamparinas e vendedores de flores, se nunca houvesse passado o tempo. Um passo mais rente, a aflição saborosa no perigo de ser vista, olhos baixos, caminhava. No final de um semi-círculo descrito pelo corpo, uma curva inevitável, a relutância e o abandono, como se o gavião fizesse a vítima, a proximidade entre voar e morrer, mais um pouco e ela já queria. Deixou cair os restos de gravetos que as mãos quebraram, seguiu pela única direção que se marcava. Ele a viu. Ela o olhou.
Artênius Daniel

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