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terça-feira, dezembro 28, 2010

OLHAR DO MEU BAIRRO.

Nom vedes, meus caros, nos meus tornezelos
Os ténis comestos do tempo,
Da terra, do’asfalto, da chúvia’e dos ares?
Penduram por cima do cham areento
Os figos naquela figueira
(Arrecendem tam perto da noite vindoura).
Os olhos perseguem as ramas dos pinhos,
Perseguem os ventos inquietos
Daquela’inquietude do vivo que morre.
Aqui, nom hai muito, moravam pessoas
Casadas coa terra’e co mar
Que davam as cousas que mais precisavam.
Casados coa vida’e coa morte falavam
Dum mundo pintado por eles
No qual agomarom as súas raízes
Chegavam a ter alimento pra si
Buscando sustento na Nai,
Agora que pouco nos fica daquilo!
Já vedes em todo’o lugar no meu bairro
Uns velhos que morren, e nascen
Uns novos que chegam a’um mundo distinto.
Nom vedes ali canavais e silveiras?
Verdescem por cima de campos
Que negam uns frutos mui caros prá venda.
Nom vedes reflexos nas águas salgadas?
A pesca’industrial leva todo
E pouco nos deixam a rente do mar.
Nom vedes ali rapazada mais nova?
Já sonham cum mundo distinto,
Já sonham com urbes enormes e grises.
Nom sei se já vedes o tempo que fica
Enquanto nom morre’o que resta,
Deixando comesto’este mundo dos velhos,
Comendo’as figueiras e’os figos com elas,
Os pinhos e’os ventos inquietos,
O’asfalto e’a chúvia e’o tempo que come
Os ténis que já nom terei pra daquela
Assi tocarei esta terra
Guardando memória dum bairro’esquecido,
Assi tocarei esta terra
Por última vez a’aguardar pola morte,
Assi chegarei a ter Paz.

segunda-feira, dezembro 06, 2010

Coraçom de auga-neve
nos suportais enegrecidos
espera o vento do norte
com os membros tolheitos
polo comboio do gelo
e os dintéis do esperpento.
O paxaro morto reclama
    - águia, corvo, melro-
    a eterna idiócia que ensalça
os beiços de marmelo
a impostura de gravata
e o arado no copelo
fai da terra a sua safra
onde cem nenos pretos
jogam com buxo à bilharda
entre pinheiros e fetos
e esterco que com a auga abranda
como amolece os velhos feitos
onde só o presente manda
pois no semáforo da fábrica
mil televisons estám paradas
e espera redençom em breve
o seu coraçom de auga-neve
na anterga língua das fadas.
Coraçom de auga-neve
cérebros de manteiga
chuchaméis derretidos
alma de escravos e plebe.