Pesquisar este blog

sábado, junho 17, 2006

2

Ah, se fosse possível!
Não seria branca.
Se fosse possível não seria índia.
Ah, se fosse possível terias cores, de- cor.
Se fosse possível, não teria nem ao menos um corpo.
Se fosse possível não seria nada, nadaria apenas.
Daria à duras penas o meu possível,
sem véu,
sem ver.

Carolina Flecha

( a partir do desmembro de Artênius)

quinta-feira, junho 15, 2006

1

Mas se fosse outro momento, se estivesse mais noite, se a praça pudesse liquefazer o cheiro das folhas mais verdes em vapor, se as pessoas e as conversas estivessem mais entorpecidas, se fosse primavera, se fosse possível, ela se aproximaria. Rumando por entre as árvores, colhendo um ou outro graveto no chão, um pouco atrasada nas conclusões, retida no limite da vontade, um tanto nervosa nos dentes e lábios, mordendo frutos imaginários Se fosse certo, se fosse melhor, ela se aproximaria. Lembrou de coincidências vãs, comparou letras iniciais de nomes, se estivesse mais noite, se a praça camuflasse o amor com mais lamparinas e vendedores de flores, se nunca houvesse passado o tempo. Um passo mais rente, a aflição saborosa no perigo de ser vista, olhos baixos, caminhava. No final de um semi-círculo descrito pelo corpo, uma curva inevitável, a relutância e o abandono, como se o gavião fizesse a vítima, a proximidade entre voar e morrer, mais um pouco e ela já queria. Deixou cair os restos de gravetos que as mãos quebraram, seguiu pela única direção que se marcava. Ele a viu. Ela o olhou.
Artênius Daniel

7

As oposições fizeram nascer as separações que originam várias dores. Não que isso não produza nada. Alguns belos escritos já foram feitos por isso! Mas até mesmo os escritos são o que é vivo. E viver separando é viver se opondo. Vivo e morto, por exemplo. Não que o ato de opor e de se opor não produza nada. Muito se caminha nas oposições. Mas que caminho é esse? Um caminho lotado de paredes borolentas. Ásperas e fétidas. Com Homens, Bichos e Coisas. Todos bem separados. Com sagradas impurezas que parecem querer purificar, profanar um correto louco e livre. Sem correntes. Sem rotinas. Com pontos e contrapontos em tudo, como se no nada não houvesse um ponto de um vazio cheio de algumas contradições e contrapontos. Como se a Lógica não fosse apenas uma lógica. Posso dizer podemos. Posso falar somos seus e meus até a posse se desfazer e sermos vários de nós mesmos e de quem nem sabe que existimos. Posso não me limitar às minhas vontades e dizer sim às suas e a de todos, aos pontos, círculos, quadrados, triângulos, finitos. Posso jogar geometria e calcular o futebol. Posso fotografar as minhas nossas histórias e historiar a engenharia das paredes, dos bichos e das pessoas. Posso voar qualquer vôo que não se possa imaginar. Ser amigo das correntes, íntimo dos grilhões, ser a liberdade e nos libertarmos dentro de um quarto de quatro lados, ansioso pra ser mobiliado e povoado por palavras. O quarto papel. Posso não achar que sou a origem de todas as coisas e que elas não precisam mudar para que eu seja. Bem simples! Podemos apenas ser e sermos todos juntos mesmo que em si só. Podemos, mais que isso, nos jogarmos à entrega, aos medos, sermos contra, santos, castas, formigas, elefantes, poetas, reclamões, mesquinhos, contraditórios...sempre sendo no outro o que todos podem ser, desmembrando as separações eternas com encontros para sempre.
Francis

6

pessoas passam , carros devoram o caminho reto e certo, rotulado com sua velocidade, marcado, delimitado. quebrar barreiras, correr, andar respirar, viver, nascer de novo, fugir desta forma alucinada de regras...
um brinde a quem tem a coragem de fugir da velocidade incerta da cidade! ela me fascina, me monta e desmonta, sou apenas mais uma no meio da muiltidão, mas sinto um apelo...sou viciada por esta coisa tão ilógica e orgânica de cidade...
Luiza Caldeira De Barros

5

A alma muda, mas não muda. No urbano o corpo se funde, napele a alma se fecha. Sair do lugar para se deparar com oesgarçado, cansado. O velho travestido de novo, mimetiza-sena desordem. Porra! Quero me estilhaçar em pedaçosinvisíveis, fundir em paredes de pedra. Você não vê? O queultrapassa, extravasa, busca a extremidade inalcançável emortífera do desejo me seduz. Coisa que não se deduz. Nãominta, sinta.
Léa Gomide

4

A mulher casta em dias santos
São ondas de humor, rumores, um amor.
Acorda ensolarada e dorme adoentada
Insana, lenta.
O amor passa, o sexo passa,
Passam seus homens,
perfumes
odores
dores
Passa, passa, passagem
Paz, paz e paz.
Acabou o sexo, mulher em paz, sem sexo.
É o diabo!
Carolina Flecha

3

Mudanças constantes atravessam os movimentos feitos e lufa uma braçada de ar fresco. Superfícies nunca imaginadas, absorvidas pelo sopro de vento novo. Quem sabe ventania?! Sem limites: nem escolhidos, nem impostos... Viver um dia diferente, rotina é não ter rotina. Será q isso seria possível? Até a falta de rotina se tornaria uma nova rotina. O que seria então o novo? O velho? A mudança... Mudanças seriam descontinuidades... Mas como crescer sem um processo? Continuidade dentro da descontinuidade... Continuidade de instabilidades, de hábitos mortos, mas que nos perseguem como grilhões. Ser casto? Seria possível não se abalar por todos esses hábitos?! Mais uma vez o ponto e o contraponto... Tudo prossegue em sua dualidade infinda. São circunstâncias vividas ao extremo e por isso mesmo negadas com toda a veemência. O movimento continua. Cada dia uma nova oportunidade, na velha mesmice de sempre... Tudo enfadonho, trazendo a sensação de figurinha repetida, de densidade emocional, de complexidade, e, por isso mesmo, o prazer e a leveza, que transforma a vida em raiar de sol, em lua cheia... Renata Caldeira

2

Tolices humanas, tolices mundanas, tolices urbanas... tolices externas que se internalizam. Vamos profanar? Vamos consagrar? Vamos nos prender ao mundo? Às pessoas (quem são?)? Vamos nos agarrar a tudo o que é passagem?
Vamos nos martirizar por quebrarmos as correntes? Queremos as correntes? Culpas, preocupações, aflições... para quê? Proporcionemo-nos o gozo! Que tal um vôo sobre a superficialidade e um mergulho na intensidade?!
Casta? Basta. Perder-se! Para encontrar–se nas escolhas próprias.
Para emergir em suas próprias soluções.
Ser a maré em lua cheia! E afundar quem ou o que não sabe ou não quer se manter na superfície. Deixar que os “intransigentes” sejam engolidos, sejam absorvidos pelas ondas que nos compõe. Pelas ondas que nos movimentam. Sejam elas revoltas ou tranqüilas...
as nossas! Que esses intransigentes, que nos evocam ao espírito aventureiro sejam parte desse mundo complexo de nossas mudanças de tempo, de hábito, de tempero, de adjetivos abandonáveis... Definir-se: mudança!!! Limites? Os que eu escolho.
Fernanda Paccelle

Com ou sem

Raymond Fosca, o herói do livro de Simone de Beauvoir, é realmente imortal — ele não deixa de existir quando tem sua cabeça decepada. Se assim o fosse, não teria hesitado um minuto sequer em decepá-la ele próprio.